segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

Ainda sobre o Silêncio - Kate



Ouvi, em dias recentes, que o silêncio é um dentre alguns poucos itens considerados valiosos neste século, junto ao tempo e ao espaço.
Ter silêncio virou objeto de desejo.
O homem aprendeu a falar há muitos anos, mas esqueceu-se do silêncio, desde então, foi pouco a pouco abandonando o silêncio num canto escuro, como se a evolução não combinasse com ele. Como se silêncio e crescimento não casassem. Deve ter havido tempo em que devia ser vergonhoso e pouco digno tanto silêncio.
Agora? Agora não!
Agora este é buscado e ansiado. Logo mais alguém inventará alguma forma de comercializá-lo, uma vez que em dias atuais tudo definitivamente é pensado em função do capital. Logo, teremos de comprar silêncio e haverá os que ganharão benefícios do estado com fartos nacos de silêncio grátis.
- Vai um silêncio aí? – vão nos gritar pelas janelas, nas ruas, no mundo virtual.
- Puxa! Meu marido vai me matar quando vir a fatura do cartão de crédito. Gastei até o limite com silêncio! – as esposas medrosas, mas consumistas vão se lamentar.
- Você viu no noticiário? Eles estavam contrabandeando silêncio e lucrando com isso! Onde é que vamos parar desse jeito? Será que não têm pena nem das crianças? Se continuar assim, elas jamais saberão como é o silêncio!– se revoltarão alguns.
Pensando assim, vivo intensamente cada silêncio que consigo. Assusta-me às vezes em que não consigo curtir o silêncio que me chega naturalmente, como se meus sentidos não soubessem mais do que se trata. Meus neurônios fazem suas sinapses e demoram cada vez mais tempo para clarear a informação: isso é silêncio! Ah!
Na realidade, o silêncio parece inversamente proporcional à presença humana: quanto mais gente, menor o silêncio.
Há que se esclarecer que a ausência de silêncio não significa uma interação profunda e empática entre as pessoas, muito pelo contrário. A falta dele é quebrada com sons que mais afastam que aproximam: carros, buzinas, músicas (algumas boas, a maioria ruins), gritos, xingamentos e palavras superficiais.
Palavras são boas para conectar pessoas, mas diálogos superficiais não nos levam a lugar algum. Parecem servir, na maioria das vezes, para multiplicar a distância, despistar desavisados ou freqüentemente não cairmos no desconfortável silêncio.
Silêncio, substantivo cheio de adjetivos contraditórios: desconfortável, desejado, difícil, calmante, irritante, poderoso.
Quando soubermos nos achegar uns aos outros em silêncio, nos encontrar em silêncio, nos sentirmos bem uns com os outros em silêncio, quando soubermos aguardar respostas em silêncio, quando o silêncio fizer parte de nossa humanidade, teremos enfim crescido.

Nenhum comentário: